sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

A Chorona do Pingo Doce

Era o mesmo Pingo Doce de sempre, as mesmas compras de sempre, a mesma operadora de caixa de sempre. Só que desta vez as lágrimas saltavam-lhe dos enormes olhos verdes, duas a duas, caíam sem parar. Não sabia o que fazer e fiquei num misto de angústia e congelamento a olhá-la, enquanto me arrumava as compras todas no saco e deixava cair vezes sem conta as minhas bolachas. Será que lhe pergunto se precisa de alguma coisa? – Pensava eu. Talvez começasse a chorar mais, e se chamasse alguém, alguma gerente, alguém que a pudesse substituir, para que ela pudesse chorar tudo o que lhe apetecesse numa qualquer arrecadação do Pingo Doce? – Talvez fosse pior. Troquei olhares com um senhor que estava na fila, também ele ali angustiado, ali congelado, a ver se eu perguntava primeiro e lhe aliviava do mesmo peso que estava a sentir. E lágrimas caíam nas minhas compras, duas a duas, dos enormes olhos verdes. Enquanto pensava como resolver aquilo, ela disse-me entre soluços e choros: São de-zoi-to eu-ros e qua-renta…. Minha se-nho-ra… -  E eu paguei, entre a minha angústia e congelamento. Lembrei-me de dizer um rol de provérbios que me iam na cabeça: Não há mal que sempre dure; Depois da tempestade vem sempre a bonança; O que não nos mata só nos torna mais fortes… - Mas não disse provérbios. Desejei-lhe “Uma boa noite”. Foi “uma boa noite” muito sentida, porque mais não fui capaz de dizer, de fazer. Carreguei as compras até casa com o pensamento na chorona do Pingo Doce. Porque choraria ela, porque não conseguia parar? Desejei muito que tudo lhe corresse bem e que lhe estivesse a acontecer passasse depressa, para ela me voltar a perguntar com um sorriso na cara: Queres um saco ou dois, filhota? Estas batatas são boas, não são, filhinha? Oh filha, mete aí o cartão na máquina. – Chorar assim é que não, ninguém merece.

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