Lá vai a
desgraçada
Sem nada em que acreditar
Sem saber de
nada
Lá vai ela
Tropeçando
nos passos
Vendo reflexos nas janelas
Tentando esconder embaraços
Os dos outros e os dela
Vai à espera que a vida se acabe
Escondendo cansaços
Amarrotando o que sabe
Às vezes vai insultada
Mas não consegue fugir
E segue desgraçada
Com golpes por desferir
Segue com a roupa rasgada
Com o rimel esborratado
É a vida de uma desgraçada
Que não escolheu um lado
Só o das pedras dos castiçais
O que bastava para ser feliz
Que não escolheu um lado
Só o das pedras dos castiçais
O que bastava para ser feliz
Soluçando,
esconde os sinais
Cola os bocadinhos de verniz
Pega nos seus restos mortais
E vai, vai desgraçada
Trocando o
certo pelo incerto
Despertando os órgãos vitais
Despertando os órgãos vitais
Ainda assim é uma chama apagada
Cai como uma
bala de chumbo
Em câmara lenta
Fica a aguardar pelo fim do mundo
Espera por ali deitada
Que venha o padre com a água benta
Que lhe cure todas maleitas
A deixe curada
E de malas feitas
Espera por ali deitada
Que venha o padre com a água benta
Que lhe cure todas maleitas
A deixe curada
E de malas feitas
Ele que a leve arrastada
Se for preciso
Que desenhe uma cruz no umbigo
Que desenhe uma cruz no umbigo
E lá vai a desgraçada
Presa pelo pé ou por uma mão
Presa pelo pé ou por uma mão
Vai de língua anestesiada
Com a caixa
de sapatos novos
Metida no lugar do
coração
Tantas desculpas, todas em vão
E continua a desgraçada
Embrulhada num lençol de emoções
A ser puxada aos tropeções
Perguntaram-lhe um desejo
E ela pensativa
Com lábios em forma de beijo
Perguntaram-lhe um desejo
E ela pensativa
Com lábios em forma de beijo
Respondeu limpando a saliva
Que queria voltar de alma lavada
Que queria voltar de alma lavada
A agradecer
tudo o que tem
Não ter de dar explicações
Não ter de dar explicações
Continuar a ser uma desgraçada
E desgraçar-se com alguém.
E desgraçar-se com alguém.