Está na hora
de fazer a limpeza anual
Trocar de
roupas
Deitar fora o
que não nos serve
Mandar embora
o que não nos faz falta
Arrumar as
prateleiras, esvaziar as gavetas
Passar um
pano no passado e no futuro
Puxar o
lustro ao presente e deixá-lo a brilhar
As limpezas
anuais custam
O pó, o
insuportável pó
A mim
provoca-me alergias
Uma defesa do
meu corpo a coisas estagnadas
Esquecidas
pelo tempo
Engolidas por
dias cinzentos e aborrecidos
Embalo tudo
Ponho película
aderente, muita,
No que não
quero ver, devolvo ao remetente
Não me fazem
falta, nunca precisei delas
Se não
preciso, não as quero na minha vida
Quem é que
precisas de coisas
Quando tem
sonhos e desejos
‘Águas
paradas não movem moinhos’
Disse-me a
minha mãe muitas vezes
Está na hora
de fazer a limpeza anual
De começar a
rezar
De começar a
chorar
Dizer adeus
às roupas velhas
Acenar aos
borbotos e elásticos soltos
Às
recordações esquecidas
Que se
arrastam sem saberem de onde vêm
Onde moram,
quem são
Livremo-nos
de tudo que não precisamos
Do que não
sentimos,
Que não dissemos
por palavras ou afectos
De nada
serve. Pesos mortos.
Não se pode
viver embrulhado em teias de aranha
Com bolas de naftalina
nos olhos e na boca
Sabão azul e
branco nas mãos
Recortes de
jornais nos ouvidos
Não, não se
pode viver assim
Está na hora
da limpeza anual
E que no fim
se faça o teste do algodão
Em cada
palavra, gesto… Poro.
Começo eu.
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