domingo, 29 de abril de 2012

Cosi a boca

Abracei o silêncio
Envolvi-o com os meus braços
Com as minhas pernas
Mergulhei todo o meu cabelo
E deixei-me submergir

Cosi a boca para não mais falar
Para não se confundir o riso
Com excesso de confiança
Para não se interpretar mal
As palavras pronunciadas

Sigo em silêncio, de boca bem cosida
Os olhos mais abertos que nunca
E os ouvidos são de tísica
O cérebro vai à velocidade da luz
Processando as palavras não ditas

Consome-as, rasga-as, evapora-as
Através da transpiração do corpo
E que bem que me sabe este silêncio
O não tropeçar mais na compreensão
Que nunca me foi dada

Fico a observá-los do alto
Do meu silêncio
Matam-se e esfolam-se em disputas
De felicidade, de egos, de poder.
Isto é uma vida, não é uma guerra

Os seres humanos que não conseguem
Ser felizes, precisam de guerras interiores
Ou compradas para se alimentarem
Chamam os amigos, sentam-se à mesa
Dão as graças, brindam e comem tudo.

Sempre me deu vómitos,
A minha esofagite de refluxo
Nunca me permitiu engolir certas coisas
O silêncio ajuda a proteger as paredes
Do estômago, acalma o ardor.

A boca cosida impede-me
De participar em genocídios
Que me colocam na linha da frente
E que bem que me sabe este silêncio
O colete à prova de balas

Sento-me aqui,
Baixo as armas e rendo-me
Cruzo os dedos e faço figas
Que tenhas aprendido a linguagem
Dos meus olhos...

Os seres humanos que não conseguem
Ser felizes, precisam de guerras interiores
Ou compradas para se alimentarem
Chamam os amigos, sentam-se à mesa
Dão as graças, brindam e comem tudo

E eu... Eu, de boca cosida,

Abracei o silêncio
Envolvi-o com os meus braços
Com as minhas pernas
Mergulhei todo o meu cabelo
E deixei-me submergir.




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