A melancolia vicia-me
Com um trago de fumo
Um gole numa bebida
Que me faz arder a
garganta
Às vezes amarrota-me por
dentro
Fazendo estilhaçar pedaços
Da minha velha alma
Espantando os pássaros
Que vivem pousados nela
Batem as asas com tanta
força
Que às vezes o peito dói-me
Esse silêncio diz mais do
que
Qualquer palavra
Tem cheiro de terra
molhada
E de madeira ardida numa
lareira antiga
A tua não expressão arderá
Para sempre em mim
Sem quaisquer vestígios de
cinza
A melancolia vicia-me
Como uma droga
Que não posso largar
O sorriso mudo
Atravessa-me como uma espada
Como uma dor que preciso
sentir
Para saber que ainda
Habito neste corpo
A melancolia vicia-me
Porque é só minha
Pessoal e intransmissível
Inexplicável por palavras
Música, dança
Não vem nos livros
Não se aprende na escola
Não quer dizer que sinta o
que digo
Muito menos que não sinta
o que
calo.
As palavras dizem tão pouco
As palavras dizem tão pouco
Escondem tanto
Colam-se ao céu da boca
Como uma hóstia
Como uma hóstia
Para serem projectadas
A metros de distância
A metros de distância
Em todas as direcções
Indiscriminadamente
São balas.
Não te quero atingir
Nunca vou ter as respostas
Que podiam melhorar tudo
A melancolia vicia-me
Substituo os pássaros silenciosos
Os que vivem pousados
Na minha velha alma
Na minha velha alma
Pelo som de harpas
Cordas de violinos
E bailarinas em pontas
E bailarinas em pontas
O truque é nunca mostrar
O lado do avesso,
Aquele que se incendeia
Aquele que se incendeia
No estômago e revira tudo
Que faz ir para o norte
Quando o sentido é o sul.
Há dias de luz
Em que a melancolia e a
comédia
Se entrelaçam como lã num
tear
E fico naquele bordado
dias sem fim
Tudo se agarra a mim
Com a força do universo
Não dá para seguir em
frente
Deixar cair tudo ao chão
Sem voltar o rosto e
reparar
No que se perde pelo
caminho
No que desaparece
Da minha velha alma
Onde os pássaros gostam
De estar pousados
Batem as asas com tanta
força
Que às vezes o peito dói-me.
A melancolia vicia-me.
Eu sei.
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