A vizinha de cima passa a sopa. O do segundo fura à parede. O
do lado seca o cabelo. E eu aqui. Onde não há mar. Cheiro a sardinhas. Apenas o
som das teclas. Marcam o compasso das músicas que vou ouvindo. Milhares delas. Horas
a fio. Não podendo sair, vivo aqui sentada. A viver mil vidas através de histórias
que vou escrevendo. Das personagens que falam por mim, que vivem por mim. É um
tipo de expiação. A música faz-me sentir coisas quando acho que estou dormente
e que tudo se foi. Levam-me aos sítios onde não posso ir. Não sinto o sol na
cara. Não me cheira a sardinhas. Não sinto o calor na pele. O meu pescoço
transformou-se num tronco de árvore enquanto repito vezes sem conta: Tu
consegues. Tu consegues. Tu consegues.
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