sexta-feira, 9 de agosto de 2013

Sombras

Olho para a minha sombra no chão e a tua não está lá,
Não está em lado nenhum. 
Sei porquê.
Não quer dizer que custe menos.
Ou não se perpetuem os meus ais
Perco-me neste corpo eléctrico
Há muito preso por um fio
Apenas a minha perna está presa a esse fio
Balanço-me como uma acrobata, faço graças
Procuro-te nos restos da minha sanidade mental
A me foge por entre os dedos como areia 
Sinto a língua áspera e as palavras gastas
Como uma manhã que precisa de um novo fôlego
Encontro-te entre golfadas de ar
Fazem-me hiperventilar
Contorço-me como um peixe fora da água
Tentando manter a dignidade
Presa por aquele fio 
Nada vai fazer com que deixe de ver a tua sombra 
E mesmo que custasse menos 
As explicações são para quem precisa delas
Para quem tem de fazer sentido
Eu que só sei sentir,
Com os olhos, com o cabelo desalinhado
Por entre os pontapés que te dou
Com o suor frio das mãos
Procuro-te
Não quer dizer que custe menos
E é sempre atrás da graça que disfarço
A planta dos pés magoada 
Que me encolho para que ninguém veja
Enquanto meu corpo se balança preso por um fio
Se enrola à volta da minha perna
Como uma serpente
Fico a contemplar as auras amorfas
Antigas e de palavras gastas. 
Um dia a melancolia vai florir no meu coração
Subir pela minha perna como um feijoeiro
Levar-me muito longe
Terei uma primavera só para mim
A minha cabeça será um campo de tulipas
Da minha boca sairão borboletas coloridas 
Os meus braços serão ramos com folhas verdes 
E flores, tantas flores e pássaros
Os pássaros cantarão presos nos meus cabelos
Hão-de alimentar-se do modo peixe fora de água
Em que me sinto na maior parte das vezes
Comerão maçãs vermelhas, as mais brilhantes
Que nascerão a cada novo ataque de pânico
E continuo à tua procura, da tua sombra
À noite acendo um fósforo, presa por um fio 
Assim sei que posso olhar para a minha sombra no chão
E ver se a tua está lá. 

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